domingo, 27 de dezembro de 2015



 A Psicanálise utiliza a Filosofia como ferramenta, pois Psicanálise é um procedimento investigativo de processos mentais, praticamente inacessíveis de outra forma, através de um acúmulo sistemático de conhecimentos sobre a mente para o tratamento das neuroses e a Filosofia, etimologicamente, quer dizer amor pelo saber, é uma palavra grega, formada por “filia” (amor) e “sofia” (saber).


 A atividade filosófica acompanha o ser humano na trajetória do desenvolvimento do seu saber, é o modo como a pessoa que quer conhecer a realidade se dirige a ela. A atividade filosófica de Indagação é a atitude de procurar saber, tentar descobrir, investigar, pesquisar, averiguar. Portanto, a indagação filosófica, inerente à atitude de quem quer buscar o conhecimento, caracteriza-se pelo perguntar o que a coisa, ou valor, ou a ideia, é. A Filosofia pergunta qual é a realidade ou natureza e qual é a significação de alguma coisa, não importa qual, perguntar como a coisa, a ideia ou o valor é. Perguntar por que a coisa, a ideia ou o valor existe e é como é. A atitude filosófica de Indagação faz parte de qualquer ciência que pretenda investigar determinada realidade. A Indagação é uma postura científica.

 O outro lado da atividade filosófica é a Reflexão. A Reflexão é o movimento da volta do pensamento para si mesmo, se interrogando, a si mesmo, sobre seu próprio pensamento, sobre sua ação no mundo e sobre as relações que estabelece com os outros seres e sobre os fatos e acontecimentos. Esta atividade é mais particular da Filosofia.

 A Reflexão movimenta-se em torno de três conjuntos de perguntas:

1. Por que pensamos o que pensamos, por que dizemos o que dizemos e por que fazemos o que fazemos?

2. O que queremos pensar quando pensamos, o que queremos dizer quando falamos, o que queremos fazer quando agimos? Isto é, qual é conteúdo ou o sentido do que pensamos, dizemos e fazemos?

3. Para que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos, fazemos o que fazemos? Isto é, qual é a intenção ou a finalidade do que pensamos, dizemos e fazemos? (Chauí, Convite à Filosofia, p. 15).

 Por isso se diz que a Reflexão filosófica é radical, pois busca as raízes da capacidade e finalidade humanas para conhecer e agir. Quais são as razões, o sentido e a finalidade de nossas ações? Essa é a atividade reflexiva da Filosofia.

 Para que as atividades filosóficas de Indagação e Reflexão possam resultar em um acréscimo de saber, é preciso que sejam realizadas de forma sistemática, isto é, com precisão, fundamentação racional e com rigor lógico entre enunciados e pensamentos. Dessa forma, nossa experiência cotidiana, nossas crenças e opiniões podem alcançar visão crítica de si mesmas e ultrapassem as características do senso comum.

 Freud descobriu que o universo dos impulsos que regem a vida do homem, e isto faz Freud um legítimo representante das correntes naturalistas. Nem sempre a razão governa nossas ações. O homem não é apenas o ser racional, assim definido pelos racionalistas. Ao concluir a existência da sexualidade infantil, por meio de sua prática como psicoterapeuta, base empírica para fundamentar suas afirmações, Freud constata que muitas formas de distúrbios psíquicos eram devidas a conflitos ocorridos na infância. Freud afirmou, em carta para Wilhelm Fliess, que ao passar da medicina à psicologia, estaria quase a concretizar seu ideal de aspiração ao conhecimento filosófico. Antes de se dedicar ao estudo da pisque humana, Freud dedicou-se à médica neurológica e na juventude, teve a filosofia como objeto de estudo, referência para compreensão do afastamento, pelo homem, dos problemas que a realidade apresenta. É sabido que a filosofia não se caracteriza por um conteúdo específico, porém isso não implica que cientistas não possuam referências filosóficas, mesmo que não se fundamentem nelas.

 Filosofar é examinar, prestar atenção, analisar com cuidado, aplicar-se às impressões e opiniões, aos conhecimentos científicos e técnicos, interrogando-se sobre o seu significado. É refletir, reconsiderar os dados disponíveis, revisar, vasculhar em busca constante do significado.

 A reflexão filosófica, para ser tal, deve ser radical, rigorosa e do conjunto. Embora a psicanálise, como as demais ciências, tem objeto determinado para o estudo dos problemas e distúrbios humanos, o psicanalista adota a atitude filosófica ao obedecer aos três requisitos da reflexão filosófica:
Radicalidade: exige-se que o problema seja colocado em termos radicais, quer dizer, é preciso que se vá até as raízes da questão, até seus fundamentos, em psicanálise, o inconsciente.
Rigor: É preciso garantir a primeira exigência, radicalidade, sistematicamente, segundo métodos determinados (métodos psicoterapêuticos).

Globalidade: O problema não pode ser examinado de modo parcial, mas numa maneira perspectiva do conjunto, relacionando-se o aspecto em questão com os demais aspectos do contexto em que está inserido.

Esses requisitos filosóficos podem parecer isolados da prática psicanalítica, mas através deles o psicanalista localiza o problema, tornando possível sua delimitação para, através da reflexão filosófica, analisá-lo e, quiçá, solucioná-lo. Freud, ao iniciar seus estudos empíricos sobre a psique humana, apresentava estas atitudes básicas que predominam diversamente, umas ou outras, em cada filósofo.

 Não seria possível a conclusão do papel desempenhado pelo inconsciente, sem que Freud obedecesse às três atitudes mais frequentes dos filósofos, resguardadas diferenciações por vezes fundamentais:

A admiração: Atitude vinda da Grécia clássica (Platão e Aristóteles) é o impulso inicial de todo filosofar. No comportamento admirativo, o homem toma consciência de sua própria ignorância, o que o leva a interrogar o que ignora até atingir a supressão da ignorância, isto é, o conhecimento.
A dúvida: Tendo Descartes como representante (Discurso sobre o Método) neste comportamento a verdade é atingida através da supressão provisória de todo conhecimento. A dúvida metódica aguça o espírito crítico próprio da vida filosófica, e nisso reside a eficácia.

A insatisfação moral: Se em seu comportamento usual o homem é encontrado absorvido no mundo que o cerca, a filosofia se impõe como tarefa a partir do momento em que este homem quotidiano cai em si e se pergunta pelo sentido de sua própria existência. O mundo exterior é abandonado em consequência de um sentido de insatisfação, levando o homem a tomar consciência da própria miséria.

Sigmund Freud, além de fundador e o mais expressivo representante da psicanálise, põe em relevo um novo objeto de investigação, o inconsciente. Ele procurou evidenciar a determinação inconsciente de ações, sentimentos e condutas e tornou a prática psicanalítica numa interpretação filosófica da vida.

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